13/06/2012 (Quarta-feira)
ILUMINE-SE!
|
OS DIREITOS AUTORAIS DE "SOLILÓQUIOS E A VIDA FELIZ" JÁ CADUCARAM, POIS O AUTOR FALECEU NO ANO 430 DE NOSSA ERA. PORTANTO, HÁ MAIS DE SETENTA ANOS. POSSO POSTAR, VOCÊ PODE COPIAR. É DE DOMÍNIO PÚBLICO. LEI 9610, DE 19 DE FEVEREIRO DE 1998 - ART. 41. OS DIREITOS PATRIMONIAIS DO AUTOR PERDURAM POR SETENTA ANOS CONTADOS DE 1° DE JANEIRO DO ANO SUBSEQÜENTE AO DE SEU FALECIMENTO, OBEDECIDA A ORDEM SUCESSÓRIA DA LEI CIVIL. PARÁGRAFO ÚNICO. APLICA-SE ÀS OBRAS PÓSTUMAS O PRAZO DE PROTEÇÃO A QUE ALUDE O CAPUT DESTE ARTIGO.
(Continuação)
Plenitude: o oposto da indigência.
Todos se declararam de acordo. Retomei, então:
— Trata-se agora de examinar quem não está na carência, pois esse será ao mesmo tempo sábio e feliz. A estultícia significa indulgência (egestas) e isso é o que seu nome indica. Esse termo designa uma espécie de esterilidade e pobreza (inopia). Notai com particular atenção, peço-vos, quão cuidadosamente os antigos formavam as palavras de seu vocabulário. Pelo menos — e isso é evidente — em especial algumas delas, as que designam coisas cujo conhecimento nos é de todo necessário. Já concordastes em que todo insensato é indigente, e todo indigente é insensato. Espero que também concordareis em que o insensato possui o espírito cheio de defeitos (spiritum esse vitiosum), e que todos esses vícios da alma se encontram incluídos na única palavra: stultícia. Ora, no primeiro dia de nossos colóquios (cf. II,10), dizíamos que o termo nequitiam (malignidade) é formado de nec-quidquam (o que nada é), com o significado de esterilidade. Ao passo que o seu oposto recebe o nome de frugulitatem (moderação) que vem de frux (fruto). Assim, pois, nesses dois termos contrários: frugalistas et nequitia (a frugalidade e a intemperança) o que está em evidência são dois conceitos: ser e não ser. Ora, na vossa opinião, qual será o contrário de egestate (indigência), sobre o qual discutíamos?
Eles hesitaram alguns instantes para responder. Trigésio aventurou-se:
— Se respondesse que é a riqueza? Pois me parece que possui como oposto a pobreza.
— Tudo isso se relaciona entre si, respondi. Pois, geralmente, pobreza e indigência são tomadas como a mesma e única coisa. Contudo, é preciso encontrar outra palavra, se não quisermos que o contrário — mais nobre — fique com um só vocábulo. De um lado, haveria abundância de termos: pobreza, carência e indigência; e do outro, uma única palavra: riqueza. Seria totalmente absurdo, com efeito, se existissem para a indigência vários vocábulos, e para designar o seu contrário, a própria carência!
— Plenitude! exclama Licêncio. Esse termo, se pudermos empregá-lo, creio eu, seria bem o oposto à indigência!
Sentido da palavra: plenitude.
Talvez mais tarde heveremos de tratar mais diligentemente dessa questão de palavras. Isso é secundário na investigação da verdade. Ainda que Salústio, escritor que ponderava mui cuidadosamente suas palavras, tenha oposto "opulência" à "indigência". Contudo, aceito o teu termo "plenitude". Pois não nos deixemos perturbar aqui por medo dos gramáticos, e temer de sermos censurados por aqueles mesmos que puseram seus próprios bens à nossa disposição.
A essas palavras eles riram. Prossegui:
— Quero preservar-me de prezar pouco os pareceres que propondes, pois quando estais atentos a Deus, sois como oráculos Seu. Vejamos, pois, o que significa essa palavra "plenitude". Nenhuma outra, penso eu, está mais próxima da verdade. Assim, plenitude e indigência são termos opostos. E aqui, como para intemperança e moderação, duas coisas apresentam-se: os conceitos de "ser" e de "não ser" (cf. IV,30). Justamente, se a estultícia é indigência, a sabedoria será plenitude. E, com razão, muitos consideram a moderação como sendo a mãe de todas as virtudes. A esse respeito, Túlio é do mesmo parecer num discurso popular:
"Pense cada um o que quiser, quanto a mim, estimo que a frugalidade, isto é, a moderação ou temperança, é a mais excelente das virtudes".
Palavras muito doutas e oportunas. Túlio considerou aí a raíz de fruges (fruto), no termo frugalidade. Isto é, a fecundidade do "ser". Como na linguagem vulgar, emprega-se ordinariamente frugalidade no sentido de parcimônia. Túlio esclareceu o que pensava, anexando duas outras palavras sinônimas: moderação e temperança (modestiam et temperatiam). São essas duas palavras que examinaremos atentamente a seguir.
(Continua)
(Por Aurelius Augustinus *354 +430).
Eles hesitaram alguns instantes para responder. Trigésio aventurou-se:
— Se respondesse que é a riqueza? Pois me parece que possui como oposto a pobreza.
— Tudo isso se relaciona entre si, respondi. Pois, geralmente, pobreza e indigência são tomadas como a mesma e única coisa. Contudo, é preciso encontrar outra palavra, se não quisermos que o contrário — mais nobre — fique com um só vocábulo. De um lado, haveria abundância de termos: pobreza, carência e indigência; e do outro, uma única palavra: riqueza. Seria totalmente absurdo, com efeito, se existissem para a indigência vários vocábulos, e para designar o seu contrário, a própria carência!
— Plenitude! exclama Licêncio. Esse termo, se pudermos empregá-lo, creio eu, seria bem o oposto à indigência!
Sentido da palavra: plenitude.
Talvez mais tarde heveremos de tratar mais diligentemente dessa questão de palavras. Isso é secundário na investigação da verdade. Ainda que Salústio, escritor que ponderava mui cuidadosamente suas palavras, tenha oposto "opulência" à "indigência". Contudo, aceito o teu termo "plenitude". Pois não nos deixemos perturbar aqui por medo dos gramáticos, e temer de sermos censurados por aqueles mesmos que puseram seus próprios bens à nossa disposição.
A essas palavras eles riram. Prossegui:
— Quero preservar-me de prezar pouco os pareceres que propondes, pois quando estais atentos a Deus, sois como oráculos Seu. Vejamos, pois, o que significa essa palavra "plenitude". Nenhuma outra, penso eu, está mais próxima da verdade. Assim, plenitude e indigência são termos opostos. E aqui, como para intemperança e moderação, duas coisas apresentam-se: os conceitos de "ser" e de "não ser" (cf. IV,30). Justamente, se a estultícia é indigência, a sabedoria será plenitude. E, com razão, muitos consideram a moderação como sendo a mãe de todas as virtudes. A esse respeito, Túlio é do mesmo parecer num discurso popular:
"Pense cada um o que quiser, quanto a mim, estimo que a frugalidade, isto é, a moderação ou temperança, é a mais excelente das virtudes".
Palavras muito doutas e oportunas. Túlio considerou aí a raíz de fruges (fruto), no termo frugalidade. Isto é, a fecundidade do "ser". Como na linguagem vulgar, emprega-se ordinariamente frugalidade no sentido de parcimônia. Túlio esclareceu o que pensava, anexando duas outras palavras sinônimas: moderação e temperança (modestiam et temperatiam). São essas duas palavras que examinaremos atentamente a seguir.
(Continua)
(Por Aurelius Augustinus *354 +430).
Nenhum comentário:
Postar um comentário